domingo, 19 de julho de 2009

[Conto] Tobias perdeu a alma!

Tobias era apenas mais um dígito, desses que carrega no peito o mais puro humor negro e na cara um desesperado sorriso amarelo. Não era timidez, era falta de inspiração - seu sopro de personalidade havia sumido um dia, não se sabe qual, nem quando, nem porque. Acordava todo dia no mesmo horário, comprava pão, ia pro trabalho, separava o lixo, ia à missa - tudo sem inspiração, sem transpiração, sem motivo. Desde o dia que perdeu a alma (não se sabe quando!), não elevava a voz, não reclamava, não se surpreendia. Como bom cordeiro, seguia do estábulo para o campo onde pastava, e com o mesmo rigor voltava do trabalho para casa. Tobias não fazia sexo, porque tinha sido emasculado pelo cotidiano. Trabalhava no trabalho e em casa, mas não sabia até quando. Um violão sem cordas, um anzol sem isca, um brinquedo sem criança. Tobias não vendeu a alma, não trocou por outra, nem se desfez dela - simplesmente a perdeu um dia, sem se dar conta, como quem perde um isqueiro.

6 comentários:

Fátima disse...

"Socorro!
Não estou sentindo nada
Nem medo, nem calor, nem fogo
Não vai dar mais pra chorar
Nem pra rir...

Socorro!
Alguma alma mesmo que penada
Me empreste suas penas
Já não sinto amor, nem dor
Já não sinto nada...

Socorro!
Alguém me dê um coração
Que esse já não bate nem apanha
Por favor!
Uma emoção pequena, qualquer coisa!
Qualquer coisa que se sinta...
Tem tantos sentimentos
Deve ter algum que sirva
Qualquer coisa que se sinta
Tem tantos sentimentos
Deve ter algum que sirva...

Socorro!
Alguma rua que me dê sentido
Em qualquer cruzamento
Acostamento, encruzilhada
Socorro! Eu já não sinto nada...

Socorro!
Não estou sentindo nada [nada]
Nem medo, nem calor, nem fogo
Nem vontade de chorar
Nem de rir...

Socorro!
Alguma alma mesmo que penada
Me empreste suas penas
Eu Já não sinto amor, nem dor
Já não sinto nada..."

Socorro - da curitibana Alice Ruiz e do maravilhoso Arnaldo Antunes...

óbviamente que li todo seu texto recordando dessa música...

hehe...

E quer dizer que "Sobre aquelas horas" foi um dos melhores textos que já leu lá no Vento e Chuva? Que responsa hein, e olha que falar assim da nossa rotina é bem fácil...

Beijos!

Eduardo Martins disse...

Viver s/ sonhos, s/ inquietação... Às vezes entramos num mecanicismo de fazer desgosto. Tenho um poema, em que fiz em parceria, chamado Salafrário salário que digo: trabalhar, estupro, consentido. Creio que tudo na vida é consentido. Que ele não se permita. Isso deve ser coisa feita... Será?!? (rs)
abraço e bom retorno

Carol disse...

Parabéns! O conto está muito bom, belo modo de abordar um assunto tão recorrente. Mais uma boa macumba para fechar o corpo e abrir a alma.

Gustavo Martins disse...

PQP Fidel! Que bom que voltou a postar!

Tobias era um coitado de um FDP e morremos de medo de um dia parecer com ele

as viciadas disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
as viciadas disse...

Tobias deixou de ser um homem e virou um saco de batatas ambulante.


L.